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PM promove carnificina após morte de sargento no AM, diz jornal

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O homicídio do sargento da polícia militar Michael Flores Cruz, de 36 anos, em Tabatinga, a 1.106 quilômetros de Manaus, no último dia 12 de junho, desencadeou em um banho de sangue no município, atribuído aos colegas de fardas do sargento. Sete pessoas foram mortas, corpos foram abandonados no lixão e casas foram invadidas pelos agentes. 

  A onda de violência teve início com o assassinato de Michael. Por volta do meio-dia daquele sábado, ele estava na região portuária de Tabatinga quando foi alvejado com dois tiros, um deles na cabeça. Outro PM que estava ao seu lado levou um tiro no ombro, mas reagiu e matou o atirador.  

Logo após o assassinato, um áudio distribuído via WhatsApp fez a convocação: “Todos os PMs que estiverem de folga desloquem-se para o 8º Batalhão para manter uma reunião aqui. Nosso colega M. Cruz foi a óbito”.

Durante a ‘caçada’, os agentes ameaçaram familiares dos mortos, adulteraram atestado de óbito e impuseram a lei do silêncio tríplice fronteira, uma estratégica porta de entrada no Brasil para a cocaína peruana e para o skunk (maconha mais potente) colombiano.

A procura se tornou implacável a supostos comparsas do atirador, embora testemunhas acreditem que os alvos incluíssem também jovens com passagem pela polícia sem aparente relação com o assassinato.

Muitos PMs agiram à paisana e usavam capuz para evitar identificação. Participaram homens das cidades vizinhas de Benjamin Constant e Atalaia do Norte, além da Rocam (Rondas Ostensivas Cândido Mariano).

Em uma das casas invadidas, os policiais suspeitaram que moradores estivessem gravando a ação e desistiram de levar três homens rendidos e deitados no chão.

  A ação truculenta respingou até na Colômbia, que tem fronteira direta com Tabatinga. No bairro Porvenir, de Leticia, homens da Rocam apontaram armas contra cidadãos colombianos. O caso, denunciado à Polícia Nacional da Colômbia, está sob investigação e foi relatado a Bogotá.  

No lado brasileiro, de acordo com testemunhas, três pessoas foram assassinadas a tiros por PMs sem oferecer resistência. Duas mortes ocorreram em via pública, e outra, dentro de casa. Um deles, Bruno de Souza Aguela, teria apenas 17 anos.

Corpos no lixão

Além dos quatro mortos, outros quatro jovens foram levados por PMs, segundo testemunhas. Um deles, Gabriel Pereira Rodrigues, 18, foi visto dentro de uma viatura, aparentemente sendo obrigado pelos policiais a indicar o local de residência de outros jovens.

Ele apareceu entre os três mortos encontrados na madrugada do dia seguinte (13) no lixão da cidade. Além de tiros na cabeça, apresentavam sinais de tortura. Rodrigues estava nu, com o ânus perfurado. Clisma Ferreira, 17, foi degolado –apenas a pele unia o corpo à cabeça. Antonio Rengifo Vargas, 20, estava esfaqueado e tinha o rosto machucado, entre outros ferimentos.

  Ao menos seis mortos tinham entre 17 e 27 anos e eram negros ou pardos (incluindo descendentes de indígenas). A reportagem não localizou os dados de dois deles. Um tinha o apelido de Caniggia e foi morto dentro de casa. A polícia não forneceu dados do atirador que matou o sargento.  

“Imagino o menino chamando pelo pai, chamando pela mãe. Essa é a minha revolta, não posso entender como existe um ser humano dessa forma”, disse à reportagem o pai, o empresário de turismo Antonio Rengifo Baldino, 50. Ele assegura que seu filho, um ex-recruta do Exército peruano, trabalhava com ele e não tinha ficha criminal.

Cidadão peruano-colombiano, ele acusa a polícia de adulterar laudo para esconder a tortura, que teria sido realizada dentro do batalhão da PM. O documento, ao qual a Folha teve acesso, deixou de registrar diversos ferimentos e declara que o exame foi realizado na presença da delegada da Polícia Civil Mary Anne Mendes Trovão. Procurada pela reportagem, ela alegou sigilo nas investigações para não responder às perguntas enviadas.

PM agiu para abafar a sequência de mortes

Em paralelo, a PM agiu para abafar o banho de sangue. A corporação espalhou a versão de que o sargento morreu durante um assalto, embora a própria polícia estivesse em alerta contra ataques da facção criminosa Comando Vermelho (CV).

  No final de semana anterior à matança, o CV lançou uma série de ataques em Manaus e em outras oito cidades do Amazonas em reação à morte de um líder da facção pela polícia. Foram incendiados viaturas policiais, ônibus, prédios públicos e agências bancárias. Na capital amazonense, o transporte público parou de circular por três dias.  

Na contra ofensiva, a polícia amazonense prendeu ao menos 82 pessoas, incluindo três supostas lideranças do CV no Rio de Janeiro, em operação com a polícia fluminense. Nessa ação, em 18 de junho, um adolescente de 16 anos foi baleado na cabeça dentro de casa. Em Manaus, um motorista de ônibus desarmado de 50 anos foi morto em casa por policiais que tentavam localizar seu filho.

Amigos e familiares relataram que não fizeram boletim de ocorrência, pois não distinguem a Polícia Civil da Militar. 

Por que vou fazer BO se a polícia mesmo está matando?”, dizem familiares dos mortos

O que diz o MPE

Em nota, o Promotor de Justiça Sylvio Henrique Duque Estrada, que responde pela 2ª PJ de Tabatinga, informou que o Ministério Público do Amazonas instaurou procedimento para acompanhar as investigações conduzidas pela Polícia Civil no município, que correm sob sigilo.

O que diz a PM

Também por meio de nota, a PM-AM, informou que no dia 12 de junho houve uma tentativa de roubo em um comércio no Centro do município, quando um policial militar, de folga, foi intervir, trocando tiros com quatro suspeitos.

Durante a ação, o policial atingiu um dos integrantes da quadrilha, mas acabou sendo baleado também. Os dois morreram. Após esta ocorrência, outras três diligências foram realizadas para capturar os demais suspeitos, havendo supostas trocas de tiros entre as guarnições e os infratores. Três suspeitos foram atingidos, sendo posteriormente socorridos, mas não resistiram aos ferimentos.  

Ainda segundo a PM, na manhã do dia 13 de junho, os policiais foram informados sobre o encontro de três outros corpos no lixão da cidade. Estes, de acordo com o comandante, não têm qualquer relação com a ocorrência em que o policial e outros quatro infratores vieram a óbito. 

O que diz a PC

A delegada Mary Anne Mendes Trovão, titular da Delegacia Interativa de Polícia (DIP) de Tabatinga, se limitou a dizer que as investigações em torno dos corpos encontrados no lixão do município seguem em sigilo “para não atrapalhar os trabalhos policiais”.

Fonte: Folha de São Paulo.

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